O que é igreja? Isso me ocorreu pela manhã, ao pensar que a
ideia comum de o que chamamos de "evangélico" seja realmente o que Jesus
chama de igreja. Porque o "evangélico" reivindicou para si a
qualidade de corpo de Cristo, quem disse que ser "evangélico" é ser
igreja? Quem disse que as instituições são de fato igreja? São definições
torcidas históricas que sutilmente causaram confusões assim como questões
doutrinárias pequenas foram sendo engolidas até o dia da Reforma onde tudo foi
novamente resignificado. Eu confesso fiquei com medo de não achar mais o
significado claro deste corpo místico de Cristo na humanidade, não conseguirei
definir, mas, por exclusão tentarei chegar aproximadamente daquilo que
realmente deveria parecer com o que o mestre chama de "igreja".
O processo para identificação de um núcleo deste calibre
começa com a afirmação correta e clara de que o princípio de "igreja"
está sempre relacionado a pessoa, ou seja, eu sou igreja, lugar onde o Eterno
mora, habita e permanece. Consideremos também que "igreja" é o que ao
longo dos tempos foi denominado um lugar com endereço, uma construção e
cadeiras onde nos sentamos para ouvir os monólogos e cantarmos antes de irmos
embora. Para podermos especificar ainda mais necessitaremos excluir alguns
ambientes e variações daquilo que se denomina "igreja" nestes tempos,
usaremos para isso a técnica de exclusão dos elementos para chegarmos através
de uma desconstrução a uma definição aproximada do que queremos entender como
igreja-templo em nossos dias e de seu papel, em parte equivocado, daquilo que
baseado no Caminho de Jesus pressupunha-se que deveria ser uma igreja segundo a
trajetória do povo de Deus desde o início até aos dias de hoje. Começaremos
excluindo as placas do prédio com seus nomes e logotipos brilhosos e enfeitados
com as fotos dos seus líderes, excluiremos também suas luzes verdes de fachada
assim como também dos púlpitos-palco e deixaremos apenas as luzes normais
usadas em residências diferentes daquelas usadas em boate, tiraremos os
púlpitos iluminados que são partes da performance-show-culto do dia dia,
removeremos os símbolos como arca, menorah, roupas de saco, altares, símbolos e
bandeiras judaicas, uvas artificiais, lençóis imitando véu que entendemos foi
rasgado e isso foi um acontecimento marcante na história da Graça de Deus que
nos garantiu acesso direto ao Eterno, é a
"antigovelhotestamentarização" da graça de Deus. Removeremos também a
estase hipnótica chata das músicas que repetidas vezes são cantadas
repetidamente com letras que no seu conteúdo tem palavras repetidas, tiraremos
as campanhas com seus doze passos para o nada que servem em determinados casos
apenas para manter o ambiente movimentado e suas programações ativas e arranjar
desculpa para barganhar com Deus por que na lógica das campanhas você precisa
dar para receber nessa roda gigante “capitalista da fé”. Removeremos logo em
seguida os cartazes iluminados para divulgar suas programações cheios de fotos
dos engravatados e das pregadoras com voz arrastada e ofegante se
masculinizando para serem chamadas de "mulheres de Deus", cartazes
esses com sua edição baseadas em Corel Draw cheio de brilhos e de aspecto
impactante para emocionar e causar impressão de poder corporativo e atrair com
seus temas de palestra motivacionais, do tipo, crescimento, expansão, colheita,
e por aí vai a ganância gospel do EU EU EU EU. Excluiremos também as desculpas
de pedido de dinheiro insistentes onde para ter tem que dar sem questionar ou
perguntar para onde vai apenas a desculpa é "a obra de Deus",
removeremos aqui o show dançante onde corpos se balançam e fazem de uma simples
dança de Davi um ministério com ares de doutrina, a alegria espontânea de
Miriam virou algo a ser assistido, ensaiado, uniformizado e com hora e data
marcada e chamado de "ministério de dança", bom seria mesmo que todos
dançassem e que isso não fosse um show, nem muito menos erroneamente como
chamam, ministério, quer dançar, bom, dance, e só não precisa espiritualizar
tudo para ser de Deus! Excluiremos também os pregadores famosos com seus carros
luxuosos e seus jatinhos que todo mundo tem a cobiça de ter igual para mostrar
poder travestido de "benção de Deus", removeremos os cantores com
seus contratos em prefeituras e gravadoras que sempre tem dois preços um real e
outro da nota fiscal, tiraremos também as estratégias "evangelismo"
para crescimento de igreja, que substituíram a pregação livre e solta da vida e
do caminho real de cada ser humano, nestas estratégias é tanta reunião paga,
encontro disso e daquilo, ofertas mil com motivos variados para podermos
consolidar algo que a milhares de anos basta somente CRER não se esquecendo de
que "Apolo plantou, Paulo regou, mas o crescimento vem de Deus".
Excluiremos aqui a insistência em chamarmos de "casa do tesouro" o
que Jesus chamou de "casa de oração para todos os povos". Não sei se
conseguiremos mais chegar ao que realmente era o significado do corpo de Cristo
com o que chamamos de igreja hoje, tudo ficou tão confuso, misturado que para
separa isso será muito individual e pessoal de cada ser humano, cada um saberá
de si sobre o que é ser igreja na vida comum, temo por que o que chamamos de
"igreja" está mais relacionado a vida corporativa empresarial do que
a comunidade em que havia um coração e alma e todos tornavam comum o que tinham
para que ninguém tivesse necessidade, a falta de algo para nos apegar como
ferramenta concreta de ajuda ao necessitado, a falta de uma ferramenta que faça
nos orgulhar e dizer "na minha rua tem uma igreja com um orfanato",
"no meu bairro tem um asilo da igreja", "eu fui em um hospital
"evangélico" e não paguei nada". A falta dessas armas poderosas
e esquecidas pelo "centro empresarial da fé" o qual chamamos de
"igreja" neste país está maltratando o significado real que o Mestre
deixou para que fossemos em silêncio mais do que queremos fazer com este
barulho desprovido de significado e de conteúdo, vazio e voltado para a performance
sem amor, olhando daqui tudo parece de plástico e caricato em alguns casos!
Voltemos ao Caminho, ao Evangelho que ama, e se possível ser Bom Samaritano na
vida do outro seremos com muita alegria, sem show, sem mídia, sem cd, sem led e
com o coração ardendo para sujarmos o pé de poeira e sermos corpo de cristo que
anda pela terra fazendo com equilíbrio e sabedoria arregaçadora de mangas que
luta para que a vida do outro seja transformada em IGREJA onde o Eterno
realmente faz de casa! Infelizmente neste país não somos "conhecidos pelo
amor que temos uns para com os outros" que foi a forma como o Mestre disse
que seria a identificação de um discípulo, (João 13:35) Somos lamentavelmente
conhecidos pela festinha performática gospel que usa o entretenimento e a
pirotecnia para divulgar a "agenda de Deus" e entretermos o povo que
volta para suas casas ainda sem caráter, com amor ao mundo e as coisas que nele
há, sendo grossos com suas famílias, desobediente aos pais, mal pagadores,
mentirosos, e sem amor ao próximo, o que vale mesmo é dizer "o culto foi
uma benção, que palavra! Tudo lindooo" e o mendigo continua na calçada sem
suas necessidades reais e imediatas serem atendidas, falo de mendigo apenas
como um exemplo pra não dizer das necessidades imediatas de pessoas das
próprias "igrejas", membros que estão sem comida e com suas contas
atrasadas de baixo dos narizes dos seus pastores. Nada contra a alguma gota de
performance, mas "a fé sem obras é morta" só cesta básica não é ajuda
real e nem social, deveríamos ter aprendido com as igrejas dos séculos passados
que em seus prédios sempre tinham associados ou escola ou hospital gratuitos ao
contrário de hoje ficam vazios a semana toda. Atrair e ganhar pessoas com o
objetivo de entreter ainda é relativamente muito fácil para os
promoters-pastores, o problema é que essas vidas se divertem muito, mas não
conseguem sozinhas olhar para o céu e confiar na mão do Eterno sozinhas por que
se tornaram dependentes da festinha emocional que as fazem voltar todas as
vezes com o mesmo problema em cenários diferentes por que se tornaram templo
dependentes, isso por culpa dos pastores que se tornaram “pulpitocêntricos”
cultivaram pessoas fé-viciadas em programações e tem que se lascar para ter que
a cada uma delas ter ideias melhores e maiores se tornando ateus de si mesmos e
sobrecarregados com a logística da máquina gospel engolidora da paz. Precisamos
entender que vivo em uma comunidade, faço parte da instituição, mas eu sou
Igreja isso muda o mundo por que muda a mim mesmo! Gostaria de removermos ainda
muita coisa, mas como o temor deste texto se tornar infinito e de nesta
desconstrução termos de nos mudar para Jerusalém no afã de realmente
entendermos o significado primeiro de igreja fico por aqui na certeza de que
deu para entender onde realmente estamos e onde deveríamos estar a não ser para
quem realmente acha que o que temos é o que Jesus chamou de igreja, entendo que
este texto terá êxito reflexivo para outros que de alguma maneira são inquietos
como eu "bereiando" tudo tirando a casquinha e olhando por baixo,
levantando a pedra do jardim e vendo que nem tudo é festa e que o jardim pode
estar bonito e iluminado, mas mesmo assim
em alguns cantos tem sujeira e podridão, apesar disso o que nos mantém
dentro da arca (igreja) aturando o mal cheiro do excremento dos animais é o
juízo de Deus lá fora inundando tudo, ficaremos aqui dentro aturando o cheiro,
mas quietos nunca, e o que nos resta é tentar a todo custo achar o equilíbrio
entre luz, câmera e ação!
Bom Caminho
Armando Carvalho